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Cloroquina: Cálculo Intervalo QTc de maneira simples e prática

Atualizado: 28 de jul. de 2020



Criei o espaço do site e blog para uma maior interação com pacientes em companhamento psiquiátrico e todos aqueles interessados em conteúdos relacionados à saúde mental. Porém, estamos todos em tempos de Covid-19 e decidi produzir um conteúdo para colegas médicos sobre um dos efeitos mais debatidos da hidroxicloroquina e espero que possa ser útil.


Trata-se de uma reflexão sobre o intervalo QT e o intervalo QT corrigido (QTc), importantes por nos ajudar a prevenir possíveis arritmias cardíacas com potencial de morte súbita, reações que podem ocorrer com o uso da hidroxicloroquina.


Quero deixar claro que este espaço não se destinará a discutir o protocolo proposto, nem propor um novo protocolo, muito menos recomendar o uso ou não desta medicação.


Faço este conteúdo pois sei que a medicação será usada por alguns profissionais, principalmente após o incentivo para isto em nosso país. E penso que, para aqueles que optarem por este caminho, seja fundamental que tenham conhecimento sobre alargamento do intervalo QT, o mais preocupante efeito colateral da hidroxicloroquina. Para aqueles que optaram por não a usar, vale a reflexão sobre o tema, visto que há outras medicações que podem ter o mesmo efeito colateral.


Por que um psiquiatra falaria sobre um tema mais relacionado à Cardiologia?


O cuidado e preocupação com o alargamento do intervalo QT é algo frequente na rotina do psiquiatra. Ou deveria ser, haja vista que todos os antidepressivos tricíclicos que usamos podem alargar o intervalo QTc, bem como alguns antipsicóticos.


  1. Nota 1: a Hidroxicloroquina tem potencial de outros efeitos colaterais cardíacos e de outros sistemas, que não serão abordados aqui.

Dito isto, prossigamos.


- O que é intervalo QT e intervalo QT corrigido e quais suas importâncias?


O intervalo QT mede-se desde o início do complexo QRS até o final da onda T. Representa a duração da sístole elétrica ventricular (despolarização e repolarização ventricular).







A Síndrome do QT Longo é uma entidade nosológica importante, sendo o seu reconhecimento de fundamental importância para a tomada de decisões clínicas, a fim de se evitar arritmias ventriculares malignas. Está relacionada desde pacientes assintomáticos até a ocorrência de síncopes, convulsões, arritmias ventriculares malignas, fibrilação ventricular, torsades de pointes e morte súbita.


O valor normal do intervalo QT varia de 340msec a 440msec, em uma visão mais conservadora dentro da cardiologia. Há quem considere que a variação da normalidade do intervalo QT pode ir até 460msec para homens e 470msec para mulheres – valores medidos preferencialmente nas derivações aVL e D1, ou V3 eV4.


O diagnóstico de QT longo é feito com base em dados eletrocardiográficos. O intervalo QT deve sempre ser corrigido para a frequência cardíaca, pois a duração do intervalo QT é sempre proporcional à frequência cardíaca.


Como calcular o QT corrigido?

A medida do intervalo QT varia com a frequência cardíaca, havendo várias fórmulas e tabelas de correção, sendo mais conhecida a fórmula de Bazett, representada a seguir:


A fórmula parece complicada e trabalhosa, mas atualmente, na prática clínica, temos inúmeras ferramentas que deixam este cálculo mais rápido e prático, como calculadoras e aplicativos.


No meu caso em particular, uso o aplicativo QTc Calculator, mas deve haver outros de sua preferência caso este não o seja.


Basta contar o número de “quadrados” do intervalo QT e do intervalo RR, escolher a fórmula a ser usada e o aplicativo já dá o resultado em MSEC.

A fórmula de Bazett é ideal para frequências cardíacas entre 60 e 90 bpm, porém não deve ser usada fora deste intervalo, já que com esta fórmula existe uma hipercorreção em altas frequências cardíacas e uma hipocorreção em baixas frequências cardíacas, distorcendo os resultados.


- Fórmulas usadas para correção do QTc:

1. Fórmula de Bazett: QTc = QT / √RR.

2. Fórmula de Fridericia: QTc = QT / RR 1/3

3. Fórmula de Framingham: QTc = QT + 0.154 (1−RR)


As fórmulas de Fridericia e de Framingham podem ter uma correção mais uniforme em um intervalo maior de frequência cardíaca. Quando a frequência cardíaca é particularmente rápida ou lenta, as fórmulas de Fridericia ou de Framingham são mais precisas e devem ser usadas como escolha, em detrimento da de Bazett.


Síndrome do QT Longo Adquirido


É difícil prever se uma droga é capaz de promover o aparecimento de QT longo e arritmias ventriculares malignas em um determinado paciente, uma vez que este fenômeno parece estar ligado não só à ação da droga nos canais iônicos, mas também à presença de variabilidade genética destes canais e a situações metabólicas e autonômicas. O aumento do intervalo QT por si só não parece ser um marcador confiável, pois drogas que aumentam significativamente este intervalo, como a amiodarona e a quinidina, apresentam probabilidades muito distintas de ocorrência de torsades de pointes, que é muito mais frequente com a segunda do que com a primeira, por exemplo.


Caso seja identificado a necessidade de utilizar alguma droga que possa alargar o intervalo QT, é fundamental saber se o paciente em questão já faz uso de alguma outra medicação com o mesmo potencial.


Algumas delas, mais comuns de se encontrar no dia a dia são: Hidroxicloroquina, Cloroquina, Amiodarona (sim, um antiarrítmico), Sotolol (antiarrítmico), Azitromicina (antibiótico, também sugerida no protocolo associada a hidroxicloroquina), Claritromicina (antibiótico), Haloperidol (antipsicótico), Clorpromazina (antipsicótico e antiemético), Clomipramina, Amitriptilina, Imipramina, Nortriptilina (antidepressivos tricíclicos).


Uma lista completa com a medicações que podem alargar o intervalo QT pode ser encontrada em www.torsades.org.



Obs.: É importante notar que o uso de uma droga pode “desmascarar” um paciente com QT normal ou discretamente elevado e portador da síndrome do QT longo congênito, até então sem diagnóstico.


Nota 2: o antiarrítmico de escolha para tratamento da síndrome do QT longo congênito são os Beta-bloqueadoes.


Monitoramento do intervalo QTc:


A melhor maneira de avaliar o intervalo é o Eletrocardiograma. Em artigo publicado no dia 02/04/2020 pelo núcleo de arritmia do InCor – HCFMUSP, versão 1; eles consideram normal até 440msec o valor de homens e 460msec em mulheres.


Consideram, para efeito de protocolo, no uso da hidroxicloroquina, seguro abaixo de 450msec. Entre 450 e 470msec o uso com cautela e de preferência somente em regime hospitalar. Entre 470 e 500msec desaconselham o uso, mas, se for feito, que seja em regime hospitalar com telemetria. Acima de 500msec colocam como valor proibitivo para administração de medicação que possa alargar ainda mais este intervalo.


Outros fatores que devem ser avaliados como potenciais alargadores do intervalo QT são: Hipotassemia, Hipocalcemia, Hipomagnesemia, QT longo basal prolongado, QT longo subclínico, Polimorfismos genéticos, Hipertrofia miocárdica esquerda, Bulimia (por práticas de purgação, como indução de vômitos, que podem levar a alterações hidroeletrolíticas), Cetoacidose diabética, altas doses da droga em questão e ainda o alargamento do intervalo QTc após a administração da droga (exemplo: 390msec antes da medicação e 410msec após).


Conclusão


Dessa maneira, fica claro que o Eletrocardiograma é a principal ferramenta a um baixo custo disponível para auxiliar na predição de riscos de medicações com potencial de alargar o intervalo QT e levar a uma arritmia grave. Mais ainda, é fundamental para reavaliar os riscos após o início do tratamento, quando se compara o QTc pré e pós medicamento, com maiores riscos aos pacientes com maiores aumentos do QTc ou com o QTc já limítrofe, de uma maneira geral. Outras ferramentas são uma anamnese completa, bem como a avaliação de eletrólitos para auxílio do médico no seu raciocínio clínico.


Por Dr. Renato Sevestrin Reche, CRM-SP: 169.803


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